Sendo eu qualquer coisa entre um crente sem religião e um agnóstico, lamento as declarações do Patriarca. Ele assume que Deus existe e quase que exige que todos acreditem nele. Comete vários erros aqui o cavalheiro.
Começa por errar ao julgar que uma qualquer fé possa ser instituída ou imposta a alguém. As questões de fé são pessoais. Dizem respeito ao nosso intimo e não podem ser ensinadas. É algo que ou nos diz o coração ou então não é fé, não é coisa nenhuma. Há que distinguir entre fé e crença. Ambas existem independentemente uma da outra.
Outro erro que comete o senhor Patriarca, é quando diz que "um povo oficialmente crente em Deus". Mas oficialmente onde? Isso tornou-se lei quando e já agora onde está isso escrito? Temos um estado laico para começar, logo nas leis da república duvido que haja lá alguma frase escondida que diga que o país é crente. Depois há ainda o facto de o que é o povo afinal? É a totalidade dos habitantes do país? É que se é isso então falta incluir os agnósticos e os ateus logo para começar. Seguidamente, é preciso ainda incluir as religiões que não acreditam em divindade alguma. Só com estes dois pontos seria difícil justificar a oficialidade da religião e crença de povo algum.
Ainda outro erro, e este não é só dele mas da sua Igreja e da maioria de todos os crentes e que também se prende com o primeiro erro, é: sabendo alguém que Deus existe mas que simplesmente não se quer "encontrar com ele" então força-se? Pelo menos para os Cristãos esta atitude é muito pouco digna das palavras de Cristo, aquelas mesmas que nos atiram constantemente à cara Padres, Bispos e demais hierarquia da Igreja de Roma. Talvez aqui seja mesmo este o problema. A Igreja Católica é a Igreja de um império defunto, o Romano, e não a Igreja de Cristo que, segundo creio, nunca precisou de Padres, Bispos, Papas nem edifícios majestosos para espalhar a sua palavra. Já para não dizer que não precisava certamente de lavar os pés em tinas de ouro como fazem os Papas enquanto pedem recato às massas populares.
Relacionado agora com a mensagem de Natal de D. José Policarpo, diz então o senhor "Temos [Cristianismo, Judaísmo, Islamismo] muitas diferenças, mas temos algo em comum, a fé em Deus, ser supremo e amigo dos homens. A nossa fé, como a vossa, constitui um elemento decisivo para que esta nossa sociedade, por vezes tão desviada de uma dimensão grandiosa da vida, encontre o sentido da harmonia, da fraternidade e da paz" (DN Online).
Pergunto então como é possível compatibilizar a Fé Cristã com a Judaica. Afinal os judeus renegaram Cristo. Como tal, como pretende então o Patriarca levar os judeus pelos caminhos de alguém que eles dizem ter sido um embuste? Parece-me no mínimo difícil mas, se calhar ainda haverá algum milagre que em 2000 anos ainda não se vislumbrou. E a mesma questão seria com os Muçulmanos.
Deixo mais uma interrogação. Como pretendem as principais religiões monoteístas explicar e levar a acreditar as pessoas que o que elas dizem é palavra de Deus quando elas, adorando o mesmo Deus, não se entendem entre elas sobre o que é que esse Deus disse? Das duas umas, ou Deus não existe ou Deus não disse nada a ninguém que os membros do clero Cristão, Judaico e Muçulmano dizem que disse e os textos Sagrados são tudo menos sagrados e essa gente anda mas é a brincar com a cara do povo.
Gostei particularmente da parte sobre a "dimensão grandiosa da vida". Diz isto alguém que pertence a uma instituição que teve coisas como a Inquisição e que cometeu as atrocidades que cometeu. Atreve-se ele a falar de vida quando as principiais denominações Cristãs, Judaicas e Muçulmanas se dedicam a espalhar e patrocinar morte e sofrimento por esse mundo fora? Mas ele já viu bem o que a Igreja dele fez no passado e as declarações e tomadas de posição actuais perante determinadas realidades (os casos dos abusos sexuais na Irlanda e EUA por exemplo)? Mas ele já reparou bem o que a sua Igreja fez em e a África? Mas ele já olhou para o Médio Oriente e já reparou bem no que Judaísmo e Islamismo fazem por lá?
Com isto tudo, D. José Policarpo, tem a lata de vir dizer que lamenta o agnosticismo, ateísmo e indiferença dos nossos dias. É preciso mesmo ter lata.